Economia, Rambling

Produtividade Aparente e Produtividade Real (I)

Agora que a crise bate à porta e a soma de todos os erros do passado não pode ser negada ou afastada da consciência, vemo-nos obrigados a encontrar soluções de recurso para evitar um cenário ainda pior. Pena é, que a urgência nem sempre está aliada à lucidez e que as soluções reais sejam mais uma vez adiadas.
Não estou optimista e não tenho muita esperança que seja esta a crise que vai eliminar as ervas daninhas e limpar o terreno para uma melhor colheita na estação seguinte.

Um dos elementos que me tira esperança, reside no facto de durante estes últimos 30 anos não ter sido feito um esforço para garantir que existisse uma componente qualitativa que desse suporte a produtividade na economia em geral. O facilitismo dominante impôs a inflação estatística dos números que se pensa serem indicativos da promoção de uma maior produtividade. E por conseguinte, temos mais licenciados, mais quilómetros de estradas, mais investigadores, mais hospitais, mais crianças na escola, inglês no ensino básico, etc…

Enquanto isso o crescimento da produtividade estagnou desde o final da década de 90, e como tal o crescimento económico foi medíocre – o PIB cresceu em média 1,1% durante 2000 a 2009. As políticas económicas seguidas durante este período tinham como o objectivo de manter a economia em pleno emprego e manter a estabilidade social. E acima de tudo compatibilizar o ciclo eleitoral com o ciclo económico. Isto foi feito com os mais diversos expedientes, a realização de grandes obras públicas, o aumento do sector público, e até a manipulação dos números do desemprego através de programas generalizados de formação profissional.

O progressivo desvio de recursos financeiros dos sectores de bem transaccionáveis sujeitos a concorrência internacional para os sectores de bens não transaccionáveis, tendência que foi acentuada com a incapacidade destes sectores de se adaptarem a uma politica cambial rígida. Resultou numa perda de influência politica e social dos mesmos, sendo que o sector financeiro e o sector da construção civil passaram a ter mais peso no momento da decisão politica. O consumo interno e o mercado imobiliário foram promovidos como via de crescimento económico sem que houvesse preocupação como isto tudo seria financiado a longo prazo.

Produtividade no seu contexto

A produtividade de uma economia pode ser vista como um sistema circulatório que pode variar o fluxo com o tempo, e que a sua capacidade potencial de escoamento depende da quantidade artérias, veias e circuitos capilares. O sistema pode construir grandes veias e artérias para aumentar o escoamento, mas sem que este aumento de fluxo seja utilizado pelo resto do corpo. As perdas podem acontecer a qualquer nível e podem ou não ser compensados por ganhos em outros pontos do sistema.

Em termos gerais as politicas macroeconómicas ao afectaram os grandes fluxos monetários e influírem nos grandes investimentos têm como resultado um maior ou menor factor de utilização dos recursos produtivos de uma nação. Mas a produtividade potencial da mesma depende fortemente de factores micro-económicos, e estes são os capilares da produtividade. Uma vez atingido o limiar do potencial de produtividade de uma economia ou se aumenta a quantidade de factores de produção ou modificam-se os métodos para melhorar o uso dos mesmos.

Ora, aqui começa o busílis político-económico, é mais fácil tomar decisões ao nível macroeconómico e isto pode ser feito ao nível do poder central, com impacto imediato na economia. Mas tomar decisões que sejam conducentes a promover acções ao nível da micro-economia, representa tomar uma miríade de pequenas decisões cujos efeitos só são conhecidos num período de tempo mais largo. E cujo sucesso depende da agregação do impacto económico de N politicas, das quais é difícil determinar a sua contribuição individual sem conhecimento de cada contexto ao nível micro.

Esta dificuldade em avaliar a natureza das medidas ao nível da micro-economia leva por facilitismo a uma fixação com quantidades nominais. E para percebermos o que se considera como produtividade de uma economia, temos que olhar para lá daquilo que é nominal e mais visível. Esta fixação pela falácia das métricas leva os decisores e restantes pessoas a olhar forma obsessiva para o número de horas de trabalho, o número de carros a sair da fabrica, ou o número de Big Macs feitos num ano, e sem que isto tenha um impacto significativo sobre a produtividade de uma economia.

Ver estatísticas sem ter em conta o que está a montante e a jusante, é cair no mesmo erro que foi feito pelas as antigas repúblicas socialistas. Que procuraram inflacionar os números, e como resultado tomaram decisões e estabeleceram prioridades que no final levaram à falência do seu sistema político.

Produtividade Explicada

No seu essencial a produtividade resulta do somatório do conjunto de pequenas diferenças de imputação de valor que são realizadas em cada processo. Por exemplo, transformar e embalar a amêndoa que é proveniente de uma colheita resulta num aumento de valor acrescentado, a esse valor vai depois ser retirado o valor dos recursos que foram utilizados para proceder ao processo. Sendo que os recursos que tiveram que ser importados não são contabilizados para a produtividade nacional.

Em relação aos meios importados não podemos dizer que estes são bons ou maus, pois são tão necessários como os outros, mas o que é mau ou bom depende da eficiência da sua utilização ou do facto da produção destes meios localmente não ser tão eficiente.

Agora, se a fábrica de transformação de amêndoa aumentar a sua produção isto vai necessariamente aumentar a sua produtividade?
Não necessariamente, pode-se aumentar a produção total mas temos um conjunto de cenários possíveis:

  • A percentagem de valor acrescentado por unidade mantém-se, e temos a mesma intensidade de uso de recursos, e como tal há um aumento de produtividade.
  • A percentagem de valor acrescentado por unidade aumenta, e temos menor intensidade de uso de recursos, a produtividade aumenta.
  • A percentagem de valor acrescentado por unidade diminui, mas a intensidade de uso de recursos mantém-se. Aqui depende do ponto de equilíbrio entre quantidade produzida e os recursos utilizados.
  • A percentagem de valor acrescentado por unidade diminui, e a intensidade de uso de recursos aumenta. A produtividade cai.

Nota: Aqui e a intensidade de recursos refere-se ao uso de factores como energia, trabalho, matérias-primas e capital.

Quando a quantidade produzida é maior e o valor acrescentado por unidade continuam a compensar então podemos dizer que a produtividade aumentou, mas se o valor acrescentado cair muito então a quantidade a produzir terá que ser muito maior para subir a produtividade.

A questão importante é que para haver produtividade têm que existir transacções, e sem existir uma troca comercial não há maneira de medir produtividade. Isto tem as seguintes implicações:

  • Produzir para ficar em armazém conta negativamente para a produtividade.
  • O desperdício tem o impacto duplo de gastar recursos e ao mesmo tempo subtrair valor acrescentado potencial.
  • Pode-se produzir a mesma quantidade, mas se aumentar o valor acrescentado por unidade a produtividade aumenta.
  • O preço, como inferência de valor, tem consequências no cálculo da produtividade.

O que resulta é que temos duas estratégias possíveis, que é ganhar na quantidade ou ganhar na qualidade. Ou será?

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